segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Candura

Para minha pequenina, a última palavra exata.

No dia
cor de rosa e azul
a vida amanheceu
cálida
e a noite estrelada a abraçou
suave surpresa

A vida,
agora.
Embalar o ninho.

Vida
acalentando vida.

Lágrimas
e sorrisos.

Para finalizar

"Enquanto a maré banhava a areia da praia, o Homem das Tulipas Holandês contemplava o oceano:
– Juntadora treplicadora envenenadora ocultadora reveladora.
Repare nela, subindo e descendo, levando tudo consigo.
– O que é? – Anna perguntou.
– A água – respondeu o holandês. – Bem, e as horas."

Peter Van Houten, Uma aflição imperial in A culpa é das estrelas, John Green.


Tanto escrevi e tanto senti nas palavras derramadas neste blog... palavras para definir, palavras para lembrar, palavras para criar... para recriar os sentidos... palavras que se tentaram exatas em meio à (in)exatidão da vida.

Minutos e horas, dias, semanas e meses depois do último post... água passando por nós, água pela vida afora... não questiono mais o que há de exato na vida. Vida encantadora, fluindo como água sobre nós, mais que exatidão, hoje acalento a sabedoria e a serenidade para admirá-la, nela mergulhar, deixar fluir, seguir... viver.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Fecundo

Ama-se a idéia antes do fato.
Ama-se o filho muito antes de ele nascer.
Ama-se a concepção. Ama-se a geração.


Ama-se a semente, antes do fruto.
Ama-se a semente, ama-se a essência, ama-se o cerne.


Por que não amar o homem que existe, ainda que adormecido?
Por que não amar o gérmen? Por que não amar a fagulha?


Qual o valor da vida, se não pudermos dizer:


"Vem, planta aqui as tuas raízes.
Sou terreno fértil.
Vem, e cresce, sem medo, em mim".

domingo, 8 de abril de 2012

Para compartilhar


sulco
por Noemi Jaffe


"foi com um espanto grave que li, nesta semana, que o hábito forma sulcos no cérebro e que, quando os estímulos nervosos atravessam os caminhos sulcados, caem inevitavelmente nessas depressões encefálicas, obrigando-nos a repetir nossos gestos e reações. decreto que a função dos poetas é, desde sempre e para sempre, pular, desviar-se, preencher e criar outros sulcos no cérebro, mais rasos, mais numerosos, mais enganosos".


Estamos mesmo decidindo os caminhos de nossa vida? Ou caimos, dia após dia, nos sulcos do hábito?

Fio


Páscoa.


Época, sobretudo, para renascer.


Reuniu forças, em um desejo sincero, e cercou-se de músicas, e de mensagens, e de palavras, de fitas de cetim, de cheiros e aromas. Buscava atiçar a memória de todas as formas. Olhou dedicatórias em livros, encontrou azeites e vinhos e funghi porcini na cozinha.


Dias atrás, a vela que lhe fora dada por um velho senhor gentil, na procissão, apagara vezes seguida, e ela a reacendera, até que aprendeu a manejá-la, a protegê-la contra as rajadas do vento, e a chama seguiu seu curso, por vezes mais impestuoso, mais intenso, e outras vezes mais tranquilo, até a vela toda se consumir.


E agora, ferida tantas vezes no mesmo lugar – Deus do céu, tantas e tantas vezes no mesmo lugar! – sabia que conseguiria renascer. Renascia, sempre. Só não sabia mais do sentimento em si. Esse, por mais que quisesse, não sabia mais se iria conseguir fazer reviver.


La esperanza dice "quieta, hoy quizás sí..." 
Rosas, La Oreja de Van Gogh

domingo, 1 de abril de 2012

Solitude

Quando você tem a exata noção de que está só – de que somos sós...


Não importam os amigos. Não importa a família. Não importa o seu trabalho. Não sei se – e quanto, se este for o caso – importam as suas escolhas.


Sei que não quero me embriagar. Não quero me entorpecer. E não falo desta ou daquela substância que me alteraria a consciência. Falo das ações que nos afastam da dor que esta consciência possa provocar – a de saber-se só.


Não posso – e não vou – embarcar na auto-comiseração. Não posso –  e não vou – obliterar a minha visão de mundo com as verdades absolutas propostas pela prática religiosa fanática. Não posso – e não vou – mergulhar no trabalho a tal ponto de não ter tempo para viver as demais áreas – as fundamentais áreas – da minha vida. Não posso – e não vou – fazer de uma relação um ancoradouro da minha existência.


Obstante tudo isso... olho para todas as coisas... olho para todas as pessoas... olho para mim mesma... e vejo a efemeridade em tudo.


Tendo consciência de mim mesma, de tudo e todos que cercam...


Tendo consciência da minha solitude, da minha finitude, de meus desejos e escolhas... uma só coisa, afinal, me parece acertada: colocar meu coração, minha chama, minha anima... no viver.


Só isto. E isto já é o bastante.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Aniversário

E foi assim, no escuro, sem soprar velinhas... sem lembranças nem mesmo por parte de sua criadora... que este blog completou seu primeiro aniversário, em 24 de março.

Algumas centenas de postagens... alguns milhares de acessos... e a busca pela exatidão na vida - será que existe?

Continuo sem respostas... mas ainda mais apaixonada pelo viver.

"Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa".
Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas.

sábado, 24 de março de 2012

Para compartilhar


Tom, amigo querido, muitíssimo obrigada!

"A água passa por uma frase e por mim.
Macerações de sílabas, inflexões, elipses, refegos.
A boca desarruma os vocábulos na hora de falar
E os deixa em lanhos na beira da voz".

O Guardador de Águas - Manoel de Barros

Brevíssimo

Escrever cabe em um breve instante. No espaço entre o abraço compartilhado... no interlúdio entre um beijo e outro... no escolher qual música vai tocar agora. Escrever cabe no silêncio entre uma fala e um suspiro. Escrever para eternizar o instante - seja pela dor, seja por amor.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Renovatio

"Found yourself in a new direction"

Foi preciso cozer o vestido roto.
Careceu trocar a água da moringa, que a primeira já não estava mais fresca.
Foi preciso plantar um novo jardim, e trocar as flores do vaso.
Necessitou mudar a mobília da sala, e mudar a cama, no quarto.
Deixou os lençóis quarando, e depois enxaguou com água com anis.
Leu os mesmos livros queridos, de novo - que a leitura, tal como a água do rio, se refaz - mas leu livros novos também. Outras melodias alcançaram seus ouvidos.
De repente, um vestido novo. Um perfume novo.
Cítrico. Vermelho. Amarelo. Verde. Azul marinho.
A pele nova. (Re) novada.

E a vida, se fazendo, refaz.

Verso no início retirado de Myth, Beach House.

terça-feira, 6 de março de 2012

Para compartilhar

Novamente, dias de muito trabalho. Mas que estes não passem em brancas nuvens: Dom Casmurro... para se deliciar, sempre.

"Era tão perto, que antes de três minutos me achei em casa. Parei no corredor, a tomar fôlego; buscava esquecer o defunto, pálido e disforme (...). Tudo arredei da vista, em poucos segundos; bastou-me pensar na outra casa, e mais na vida e na cara fresca e lépida de Capitu... Amai, rapazes! e, principalmente, amai moças lindas e graciosas; elas dão remédio ao mal, aroma ao infecto, trocam a morte pela vida... Amai, rapazes!" (cap. 86)

segunda-feira, 5 de março de 2012

Elo

A palavra exata para 03 e 04 de março de 2012. Há dias assim, parecem ser um só...


Era claro: ali existia um elo. Um elo em formação.


Poderia escolher rompê-lo... elo frágil, elo primeiro, primogênito. Elo nascente, poderia interrompê-lo, fonte de água que se perde no caminho, nascedouro que desemboca em lugar algum.


Poderia escolher fortalecê-lo... alimentá-lo com as águas das tempestades que irromperam... permitir que suas águas se tornem profundas, e que nelas habitem milhares e milhares de peixes... elo água-viva, elo que vivifica, águas que seguem seu curso, águas que abençoam tudo o que toca suas margens, águas que desembocam no profundo do mar...


Elo ainda no ventre, boiando nas águas da vida. Elo água-viva. Elo que será fortalecido, e que vai frutificar.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Juliana!

Hoje talvez fosse um dia para eu fazer silêncio... mas preferi ouvir uma música e lamentar com estas poucas palavras a morte de mais uma ciclista nestas ruas cheias de pessoas e carros apressados – somos seres prestes à colisão, vilões e vítimas em contínuo abalroamento, neste trânsito infeliz e maldito.


Em memória de Juliana Ingrid Dias, 33 anos (Deus do céu, a minha idade!), em memória de tudo o que ela conquistou em sua breve vida, e desejando que sua morte sirva para melhorar a vida neste urbano absurdo. Meu grito por sua coragem, e pela coragem de todos os ciclistas que se aventuram nesta ao mesmo tempo suja, bela, triste, estimulante, caótica e perturbadora metrópole.


****


Não consegui "colar" o link mas não deixe de clicar aqui, para ouvir "The Great Escape", em um belo vídeo que parece ter sido feito sob medida para este dia.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Razão


Acaso existe razão, na vida?

Acaso encontramos todas as razões, todos os motivos... tudo o que nos leva de lá para cá, e de novo nos traz de volta... tudo o que nos move nesta e não naquela direção?

O que, afinal, nos move? O que nos inflama?

Qual é o sopro? E qual a chama?


"Não te amo como se fosse rosa de sal, topázio 
ou flecha de cravos que propagam o fogo: 
te amo secretamente, entre a sombra e a alma.

(...)

Te amo sem saber como, nem quando, nem onde, 
te amo diretamente sem problemas nem orgulho: 
assim te amo porque não sei amar de outra maneira"



A Dança, Pablo Neruda.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Albus


Não foi uma manhã de sábado, tampouco uma tarde de domingo no parque.
O dia que ainda corre e escorre por entre os dedos não é vermelho, nem amarelo... também não se vislumbrou nele o arco-íris.
Ainda assim, o retrato da avó lhe sorriu pela manhã de um jeito diferente.
A rosa – agora solitária – suspirou e exalou um tênue perfume.
Um punhado de uvas passas claras deixou na boca um gosto mais doce.
E um livro com bela capa e todas as páginas em branco lhe foi entregue.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Fertilidade

Se é mesmo verdade que tudo nesta terra tropicana só começa, de fato, depois do Carnaval... lá vamos nós! Eis-me aqui, de volta!


Depois de ensaiar uma retomada que acabou não acontecendo, volto hoje cheia de idéias - nada exatas - e palavras que se pretendem únicas...


Isso é bom. O tempo anda escasso, a vida cada vez mais exigente, e, tanto quanto, bela e plena. Estou, mesmo, cheia de planos e desejos. Estes são tempos verdes... que venham os frutos! Ando grávida da vida, grávida de mim.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Imanência

Para 15 de fevereiro, quarta.


Imanente, a sua paixão. Apaixonado por tantas coisas... buscando os significados... esperando e lutando por tantos sonhos e expectativas...

Imanente, a sua força. Crente de que tudo é possível, crente na bondade das pessoas, mantendo sua fé e seu otimismo (quase) inabaláveis.

Imanentes, suas fragilidades, e sua coragem. Precisa muita coragem para se expor, para pedir desculpas e dizer: “olha, desculpa. Só te falei isso para me defender, na verdade. É que você tocou em uma fragilidade minha”.

Há momentos em que palavra e gesto se encontram. Palavra e gesto se encontram e se fundem. E tudo o que é imanente alcança a exterioridade. Palavra e gesto. Intenção e ato. Imanentes, transcendem.

Alteridade

Para 14 de fevereiro de 2012, terça-feira.


O outro e suas necessidades.
O outro e suas vontades.
O outro e suas escolhas.


No outro, nossos desejos.
No outro, as respostas aos nossos anseios.
O outro e nosso pedido de silêncio.
Aconchego.
Acolhimento.


Há que se ter sabedoria...


Entender quando o outro é complemento - e quando é preciso afastamento. Entender que o outro é espelho. Entender que o outro precisa continuar uno - assim como nós mesmos - para que, aí sim, seja possível unir, e somar.


"Eu não sou eu
nem sou outro
sou qualquer coisa de intermédio
pilar da ponte de tédio
que vai de mim
para o outro"


Mário de Sá-Carneiro.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Para ouvir

Porque...
"... tudo o que cala fala mais alto ao coração"

Interlúdio

Para 13 de fevereiro, linda segunda-feira.


Por vezes, o espaço é mais importante que as palavras que o circundam. O espaço e tudo o que ele contém: partículas de expectativa em suspensão, a curva da melodia, o silêncio.


Por vezes é preciso calar, e ouvir o silêncio. Ouvir a expectativa, a respiração em suspenso, o tempo do outro, a espera. O outro e sua história. O outro e a música da sua vida. Cada ser carregando suas marcas, sua história. Pode-se esperar por muito tempo... há esperas e há histórias que duram toda uma vida.


Sabia agora que não foram as palavras, mas sim tudo o que não fora dito - tudo o que coube no breve e intenso espaço entre uma palavra e outra - era aquilo que mudaria sua vida.


Um interlúdio. Um interregno. A vida em transição.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Trabalho

A exata palavra para estes últimos dias... trabalho, muito trabalho.

Mas isto não é um lamento. Definitivamente. É muito bom fazer o que se gosta. Tal como "comer o que se gosta é um privilégio", trabalhar com o que se gosta é uma dádiva.

Aqui registro, para estes dias, palavras que me encantam...

"A vida se encolhe ou se expande em proporção à própria coragem". Anaïs Nin

"Não se dê por vencida ao tentar fazer aquilo que realmente quer. Se houver amor e inspiração, creio que você não pode errar". Ella Fitzgerald

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Bem querer

A florida expressão para 08 de fevereiro, quarta-feira.

As flores do dia não foram rosas. Desta vez, crisântemos. Um colorido ramalhete... crisântemos brancos, amarelos, vermelhos. Envoltos em papel de seda, sem maiores cuidados, como se tivessem sido retirados, há poucos instantes, do jardim.

Lembrou de "bem me quer, mal me quer". A brincadeira da infância, revisitada naquele exato instante: "bem me quer, bem me quer. Bem me quer, bem me quer, bem me quer, bem me quer".

"Flores para quando chegares
Flores para quando tu chorares
Uma dinâmica botânica de flores
Para tu dispores
pela casa"

Flores, por Fred Martins e Marcelo Diniz, cantada por Zélia Duncan.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Comida


Hoje a mulher de um paciente chorou quando retirei a sonda naso-enteral que o alimentava e falei: “pronto, agora ele pode voltar a comer por boca.” Rapidamente, entre lágrimas e sorrisos, começaram as perguntas:

“E ele já pode comer cuzcuz? Tapioca, pode? Mingau de fubá, ele gosta... pode também?”

Eu sorria enquanto respondia, pensando que eles não tinham ouvido nada do que eu falado minutos atrás... mas é sempre assim. Comida, em nossa cultura, é expressão suprema de carinho, de cuidado, de afeto.

Quando os familiares ouvem que a pessoa a sua frente, que tem requerido tantos cuidados, que há pouco tempo esteve em um leito de hospital, lutando para sobreviver... quando ouvem que essa pessoa deu mais um passo em direção a sua recuperação... tudo o que eles querem é celebrar. E qual melhor forma de celebrar se não... comendo? Comendo o que se gosta?

Qual a melhor forma de demonstrar afeto se não por meio de gestos carinhosos, que se traduzem no separar e juntar ingredientes, batê-los, aquecê-los ou resfriá-los, transformá-los em algo saboroso, que alimente o corpo e a alma?

Por isso os familiares sempre se alvoroçam, quando o paciente volta a comer por boca. E dá-lhe perguntar “se já pode comer” tudo o que ele ou ela gosta. Alimentar-se é necessário. Comer o que se gosta é um privilégio... Seja macarrão, tapioca, cuzcuz, café com leite... pipoca, sorvete de chocolate, bife frito, pão francês, pirão... comemos para alimentar não só nosso corpo. Comemos para alimentar nossa alma e nossas relações. Comemos para celebrar a vida.

Para compartilhar

Li estes textos ao longo de 2011... são opiniões distintas, mas todas bem fundamentadas, sobre casamentos, sobre relações:


por Martha Medeiros:
Casamento é um estado de espírito
Promessas de casamento

por Stephen Kanitz:
O contrato de casamento
O segredo do casamento

por Gustavo Gitti:
Como esfriar sua relação
Casar por amor é uma péssima idéia

O livro "O Desafio de Amar" me foi apresentado já após a separação. Se teria feito diferença? Não sei. Mas é um bom livro, sim. O filme eu não assisti.

Contundente


A precisa palavra para 06 de fevereiro.

Se há algo que não se pretende para este post é a exatidão. O que não me impede, em absoluto, de registrar aqui os fatos ocorridos. Crônicas da vida?

Foi com surpresa e tristeza que ontem tive a notícia de mais dois casais próximos que se separaram... são agora, portanto, seis relações desfeitas, desde que a minha separação aconteceu (uma aconteceu ainda em 2011, e as outras todas nestes primeiros 37 dias do ano).

Inevitável perguntar-se: “Por quê”? Essa pergunta não encontra resposta pronta, mas não se cala: “Por quê? Por quê? Por quê”?

...

O que eu desejo, profunda e sinceramente? Que todos os envolvidos conheçam suas razões, seus “porques”. Separar-se nunca é fácil. É sempre dolorido, sempre machuca. Impossível sair de uma relação sem sair ferido. Sair de uma relacionamento significa sair carregando suas mágoas e seus sonhos desfeitos. E dá-lhe lágrimas, e dá-lhe desconstrução, por todos os lados... o ex-casal, as famílias, os amigos.

A mais precisa e concisa pergunta que ouvi, quando me separei, foi: “você tem certeza do que você está fazendo, Fabíola”? Penso que talvez esta seja a única pergunta, afinal, que se pode fazer. “Você tem certeza? Você sabe o que está fazendo”?

Fundamental esse saber. É preciso que faça sentido. Porque é tudo triste e dolorido demais. E só mesmo esse saber para minimizar o sofrimento... só esse saber para fazer com que a gente carregue, além da tristeza, os frutos... as boas lembranças, o carinho, o respeito.

Um

Para domingo, 05 de fevereiro de 2012.


O dia longo e agradavelmente cheio. Lugares e pessoas, falas e imagens se sucedendo. Sabia que, entretanto, se lhe pedissem uma só imagem, só um gesto, mais que depressa sua memória alcançaria o instante em que as cabeças, bem de leve, se tocaram... e se ouviu um suspiro, e se adivinhou um sorriso.


sábado, 4 de fevereiro de 2012

Costura


A avó, em meio aos seus mágicos instrumentos de costura – um universo delicado e colorido de agulhas e linhas, tecidos e botões, zíperes e laços – havia lhe ensinado que, sempre que uma costura não dava certo, era preciso parar, refletir, para então retomar o trabalho e prosseguir.

Hora de parar, de novo.

Haverá conserto, esta costura? Será possível unir as diferentes fazendas? Ou foi errada a escolha do tecido?

Vermelho


Para 03 de fevereiro, sexta.

A paixão é vermelha.
A ira, também.

Ambas incandescem e consomem.

Escoam os grãos de areia, na ampulheta.

Haverá tempo?
Ainda há chama?

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Dístico


Os versos exatos para 02 de fevereiro, quinta.

Rosas veludo escarlate sobre a mesa
E um cítrico perfume no ar.

Sutileza


A Letícia filosofando sobre educação, comunicação, e as indelicadezas no mundo...
As exatas palavras de uma linda garota de 8 anos para 1o. de fevereiro de 2012.

– Letícia, querida, como foi o seu primeiro dia de aula?

– Ah, tia, a professora falou que a minha letra é feia e que eu tenho que fazer caligrafia.

– Ah... Bom, o que você acha da sua letra, Lê?

– Ah, tia, ela não é mesmo muito bonita, não. Mas precisava a professora me dizer isso logo no primeiro dia de aula?

– Ah, Lê, mas a gente vai à escola para aprender, não é mesmo? Pensa nisso, e começa logo a treinar caligrafia.

– Eu sei, tia, mas quem tinha que aprender é a professora. Sabe, ela poderia ter dito assim: 'sua letra não é muuuuuito bonita, Letícia', e não dizer, logo de cara, que minha letra é feia. Ela precisava aprender a falar.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Agradecimento


Depois de presenciar, tão de perto, uma cena de violência chocante e banal (meu Deus, como nossa vida é frágil!) não há mais nada que eu possa registrar aqui, hoje, a não ser: muito obrigada, Santo Deus, por estar viva. Ganhei o presente de estar viva e estar bem, hoje, de novo.

Substância


O termo exato para 30 de janeiro, segunda-feira.

Há qualquer coisa de etéreo nesse seu jeito de falar.
Há qualquer coisa de sublime nesse seu olhar.
Seu carinho, sempre terno.
Seu abraço é sagrado.
Seus beijos são profanos.

E há sempre
algo que escapa
por entre os dedos
matéria imprecisa
invisível
que não se consegue definir
e nomear
mas que toca
e provoca
todos os sentidos.

Tríptico

ou Prece, ou Escultura.
As palavras para domingo, 29 de janeiro.


Aquele tríptico, já carcomido pelo tempo, fora um dia um belo oratório. Admirou-o. Depois, sem mais pensar, ajoelhou-se diante dele. E, em suas preces, desejou a história inacabada. Escultura de arte que tenda para o infinito, que o artista cria e da qual se alimenta, posto que lhe inspira a criar outras e outras e outras esculturas. Sem aquela nunca terminar.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Delicar

Acordei com o desejo de tornar delicado o dia. Pensei, então, que delicado é um adjetivo tão bonito... deveria ser transformado em verbo para ser posto em prática vezes sem conta.


Assim, com uma nova palavra no meu léxico e na minha vida, eu me pus a delicar...


Deitei fora a água que alimentava as rosas amarelas... mais três feneceram, ficou agora uma só... troquei-a de vaso, pus um adorno e fiquei esperando que esta também feneça... é assim, bela e finita, a vida.


Cortei os talos das rosas brancas e vermelhas; limpei-os, e os arranjei no outro vaso, com os ramos verdes que antes abarcavam a rosas amarelas. Ficou um arranjo simples, e cheio de beleza.


Depois fui estender os lençóis e as toalhas de banho para secar... e desta vez eles me delicaram, tocando minha pele com cuidado, um perfume muito tênue e suave deles se desprendendo... o leve balançar provocado pela brisa... isso tudo me lembrou da beleza que pode existir ali, pequena, no estar doméstico, nos cuidados e afazeres do dia.


O café com leite com seu amargor me delicou as papilas gustativas. Desmanchar a maciez do pão me delicou os dentes, a mucosa da boca, a língua.


Tudo à minha volta reverbera delicadeza. Não sei se é a vida que se transforma, ou se sou eu, apenas, que – delicadamente – desperto, uma vez mais, para a vida.

domingo, 15 de janeiro de 2012

Choro

Para quebrar o jejum...


Choro por tudo o que vivi...
Choro pela beleza que existiu em todos os momentos. Em todas as lágrimas. Em todos os sorrisos.
Derramo minhas lágrimas pelo amor que sempre existiu...
Derramo minhas lágrimas pelo amor profundo que, desde sempre, permeou minha existência, e todas as coisas que construi. Tudo o que, juntos, construimos.
Há tanta beleza em tudo o que já vivi...
Choro por compreender que a vida é um ciclo... existe início e fim, as pessoas chegam e, um dia, se vão... estamos, o tempo todo, em movimento. Nós somos estações... nós e nossos sentimentos.
Há que se encontrar terreno fértil para florescer... e haverá o tempo de desfolhar, e renascer.
Minha alma transborda, como a chuva lá fora, pelas coisas que  ainda não sei como, não sei quando, não sei com quem  hão de vir...


Só o tempo.



domingo, 1 de janeiro de 2012

Para ouvir


"Un terrain sur une ile, la place..pour reconstruire
Deux trois granges dans un coin, et nous seul dans ce jardin
Confiseur merci, des mélodies en si.
Suspendu a tes mains jolie tour du destin..."

Alegrias... e amor.

Para compartilhar


Até parece que eu iria tirar férias sem deixar muitas palavras que me são caras e exatas por aqui...

O mar de manhã.
O barulho da fonte nos rochedos sobre as paredes de pedra.
O vento do mar de noite, numa ilha...
(…)
O olhar e tudo o que ele olha.
As nove portas da percepção.
O torso humano.
O som de uma viola e de uma flauta indígena.
Um gole de uma bebida fria ou quente.
Pão.
(...)
O sono na cama.
O silêncio entre dois amigos.”

Trecho de Os três nomes de Deus, R. Alves, in Ostra feliz não faz pérola.

Alegrias


Um bem-te-vi, há algumas horas, ficou dando vôos rasantes na piscina, tomando banho... eu me perguntei se é o mesmo bem-te-vi que já vi fazendo isso algumas outras vezes, mas sempre mais cedo... lá pelas 6h da manhã. Fiquei olhando o bem-te-vi, em êxtase, e com vontade de mergulhar também.

Pensei em ir ao parque caminhar, mas o tempo hoje não está exatamente convidativo. Resolvi então caminhar aqui em casa, mesmo. Desci, e fiquei por uma hora lá embaixo. A percepção de tudo muda. O vento balançando as folhas dos bambus... uma dança que me fez pensar em Terpsícore... então me lembrei da dança das águas e das luzes se acendendo no Ibirapuera na noite de quinta-feira, e de como aquilo tudo me encheu de alegria e um pouco de tristeza, ao mesmo tempo.

Caminhei, e o corpo voltou molhado com a água da chuva, quente, o sangue correndo pelas veias, o coração palpitando feliz, e a cabeça cheia de idéias... uma delas foi esse texto, não exatamente o padrão de textos desse blog... esse é explícita e rasgadamente pessoal.

Lembrei de Rubem Alves (sim, de novo!) e de como ele fala que as alegrias são pequenas e efêmeras... e pensei na alegria de ter visto o bem-te-vi... na alegria que foi receber pessoas queridas ontem... na alegria que é simplesmente estar viva, e poder, pura e simplesmente, viver. A vida é assim, efêmera.

Pensei em como a gente pode se apegar à alegria ou à tristeza... como um encontro entre duas pessoas pode propiciar as mais diferentes impressões e sensações. Como se pode sair feliz, respirando música e poema, ou como se pode sair triste, com um gosto amargo na boca, porque foi o último sabor que se provou. Mas o amargo não faz parte da vida, também? Não é preciso prová-lo, também? E, em última instância, sentir esse sabor não é também uma dádiva?

Não, não estou fazendo “O Jogo do Contente”. Estou, uma vez mais – como sempre, ainda bem! – fazendo as leituras do que me acontece. Como disse a Sílvia, esses dias, “a lucidez não nos livra dos dramas.” Sim, e quer saber? Ainda bem.

Não há outra forma de viver.

(…)

Primeiro dia do ano... vou aproveitar o clima... esse blog sairá de férias. Escrever é, ao mesmo tempo, ócio e cio. Atividade deliciosa, por vezes dolorosa... sempre uma entrega, escrever. Eu queria esticar os posts até comemorar os 5000 acessos (o que deve acontecer daqui a pouco, que bom!), mas, enquanto aquecia o corpo, mudei de idéia.

Voltaremos em fevereiro... ou talvez um pouco antes... se eu não aguentar de saudades de escrever.

Para ouvir

Da trilha sonora da minha passagem de ano (Síl, querida, amei a playlist).
Gostei de muitas, mas essa reverberou...



"Je fais peu mais je fais bien
En t'attendant"