quinta-feira, 30 de junho de 2011

Absurdos

No encerramento do curso (ótimo), o professor, PhD em neurologia e em história, confirmou: “mas você não fez mesmo o trabalho escrito?” Não, professor. “Bem, faça e mande por e-mail, pode ser?” Fiquei feliz, pensando que minhas contribuições nas discussões devem ter sido razoáveis. Entretanto, apesar da minha formação pautada pela lógica, pelo raciocínio crítico e pelo apego à ciência, fiquei com uma vontade enlouquecida de romper barreiras disciplinares, e escrever sobre saúde, epistemologia, neurologia, fonoaudiologia, tarô, runas, psicologia, imaginário, horóscopo, perfis, previsões, tudo junto. Uma atitude (pseudo) transdiciplinar desesperada, para ver se entendo os absurdos do mundo.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Para compartilhar

Linda fotografia, de Anders Wallace, postada por Miguel em o silêncio dos livros

Frio

Acendeu o incenso. Não bastou. Acendeu velas. Não bastou. Foi ao fogão e acendeu todas as bocas, ficou por perto. A sopa, essa esquentou. Se tivesse lareira, acendia também. Resolveu tomar um banho fumegante. Ainda não. Colocou meias, estendeu cobertas, vestiu luvas e cachecol. De novo, não. Deus do céu, como estava gelado seu coração.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Requintado

Estava só, mas preparou o jantar com cuidado. Dois pratos cozidos, mais um assado, e pão também, salgado e assado.

Estendeu a toalha sobre a mesa, e sobre ela os pratos e os talheres. Dispôs as porções deixando um bonito colorido no prato. Estava tudo cheirando bem, mas ainda faltava algo.

Levantou-se novamente, foi à cozinha, e alcançou a garrafa de vinho ainda fechada. Sacou a rolha, serviu-se uma taça e voltou à mesa. Comeu pouco e bem.

Porque era preciso cuidar do dia. Porque era preciso colher o dia. E, principalmente, porque foi apenas mais um dia. E o dia já se bastava.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

(de) Mais

Três palavras exatas. As idéias rascunhadas na memória, tudo escrito assim, de uma vez. Quase três dezenas de atividades pendentes (sempre há tanto o que fazer...) Três cds novos... tanta música nova para ouvir.

Depois do retorno, é hora de contabilizar: os gastos, as experiências, as fotos, as lembranças...

São sabores, são imagens, são tons. São falas, são palavras, são cheiros.. a memória sorri e se encanta, o corpo responde cansado e feliz, a alma (re) anima e encontra um sentido novo em tudo, para (re) viver.

Foram três palavras exatas, de uma vez. São muitas atividades ainda por cumprir. O saldo bancário, é claro, reduziu. Mas são tantas experiências boas... viajar, respirar novos ares, (re) conhecer-se em outros lugares... é sempre mais.

Ouvindo o cd Bossa n' Roses, ótimo, com sons dos Guns n' Roses mixados em ritmo de bossa nova.

Calma

A palavra exata para 26 de junho, domingo.

Para acordar mais tarde... para arrumar as malas. Para conversar um pouco mais. Para gravar nas lentes da memória as últimas imagens. Para ouvir histórias do lugar. Para ter saudades antecipadas. Para ficar com vontade de voltar.


Avenida de Mayo 
Plaza del Congresso 
A primeira sobremesa, ou postre, em Puerto Madero

Nós quatro no subte

Nós dois na livraria El Ateneo
Flores na Avenida de Mayo
Um dos detalhes da linda Posada Palermo



Ok, vocês já sabem que eu amei a Avenida de Mayo...

Fome

A palavra exata de 25 de junho, sábado.


Você tem fome de quê? (Comida, Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Brito).

Os quatro estavam famintos. Os pés já não obedeciam mais; o sorriso estava quase crispando; a boca, seca. Era hora de comer. Já tinha passado da hora de comer.


Consultaram o guia, encontraram um restaurante a 100 metros de onde estavam. Con (viver) é exercitar sua tolerância, sua generosidade, sua paciência, sempre – mesmo com fome, ainda mais com fome. Opinaram os quatro, dois gostaram, dois não (quase sempre assim, por supuesto...) Saíram do restaurante, mais famintos ainda, mas dispostos a encontrar outro.

Nova consulta ao guia, nova consulta ao mapa, outra opção disponível: siga em frente, até o final à direita, depois mais um tanto, vire à esquerda. Chegaram, finalmente. Ainda que todos estivessem mais famintos, (con) viver só é possível porque você permite ao outro ser feliz, e o outro permite que você o seja: acordo feito à porta, sim, sim, vamos ficar apenas se todos quiserem. Parece simples? Só parece – precisa disponibilidade, muita, para conceder, para fazer dar certo (ainda mais cansados, ainda mais com fome, muita fome!)

Gostaram da fachada; foram bem recebidos à porta; sentaram-se à mesa confortavelmente; o ambiente era agradável e limpo; da cozinha vinha um cheiro fumegante e bom. Questionaram-se, os quatro, “tudo bem para você?” “pra mim, tudo bem”, e decidiram ficar.

E foi assim que tomaram um vinho maravilhoso; foi assim que provaram massas e carnes maravilhosas. Foi assim que passaram horas rindo, conversando, suspirando, provando o valor de coisas boas na vida.

Marco, Alex, Michelle: obrigada, queridos. Porque provei com vocês o amor, a amizade, o gosto bom de viver.

sábado, 25 de junho de 2011

Pasión

Esta é a palavra exata para ontem, 24 de maio.

Buenos Aires é uma cidade apaixonante. É vibrante, é intensa, é multifacetada. É uma cidade para apaixonados. É, definitivamente, um lugar para se apaixonar...

Eles torcem intensamente por futebol. Eles endeusam o Maradona. Eles amam a noite. Dançam tango com um fervor pulsante. Eles amam reunir-se, seja num café, no restaurante, no bar, na confeitaria da esquina. São muitos os que fumam.


E fazem tudo acaloradamente - vi amigos conversando animados, vi muitos casais trocando olhares e se beijando apaixonados - vi também alguns discutindo, uma discussão vermelha, quente.


Até quando se cansam de viver são intensos - ao menos assim o é o senhor idoso que cruzou conosco hoje e nos perguntou qual nossa idade - não entendemos, e aí ele nos explicou que tem 65 anos, e que tudo o que faz é esperar pela morte. Eu me surpreendi com o inusitado da situação, e disse para ele que todos nós esperamos pela morte. Ele me olhou discordando, e começou a se afastar, fazendo gestos de negação. Falei então para ele: "viva, enquanto espera pela morte!"


Afinal, tal como Pitágoras nos disse, "el hombre es mortal por sus temores e inmortal por sus deseos" - numa incrível coincidência, li ontem essa citação no Museo de la Pasión Boquense, depois de já ter escrito este post...

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Mayo

Muitas poderiam ser as palavras exatas hoje... impressionante como a vida pode acontecer de formas tão diferentes... 

Mas não são palavras exatas, e sim uma, apenas, para o dia. Que seja Mayo, então... por tudo o que representa para o povo argentino, pelas manifestações que lá vi hoje, pela arquitetura belíssima de seus prédios, pela poesia, pelos aromas de tabaco e café, pelo frio e pelas pessoas que por lá passaram, apressadas, com seus casacos, celulares e suas falas cantadas.

Há ainda muito o que falar... mas talvez eu só consiga a calma e o recolhimento necessários depois... agora é deixar a vida entrar pelos poros, por todos os sentidos... 

Estoy encantada! Estou feliz!

Miscelânea

Esta foi a palavra exata de ontem, 22/06/2011.


Miscelânea... de sentimentos, pensamentos e sensações. Essa foi a palavra exata de ontem. Primeiro, correria para acertar os últimos preparativos para a viagem. Depois, as novidades de viajar para o exterior pela primeira vez. No avião, turbulência algumas vezes... e, em solo argentino, o começar a descobrir sons, cores e cheiros diferentes.


Já na pousada - linda! - depois das 3h da manhã - cansaço e alegria... lembrei de You could be happy, Snow Patrol: "More than anything I want to see you girl, take a glorious bite out of the whole world" . Estou com uma vontade imensa de provar o mundo inteiro...

terça-feira, 21 de junho de 2011

Preparar-se

Preparar-se...
para a viagem
para o próximo passo
para o dia seguinte

sentimento exato...
palavra exata...
será que existe?

Preparar-se...
para a próxima história
para o inverno
primavera
o porvir

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Atávico

Não tenho culpa se seu mau humor é atávico. Atávicos são meus olhos castanho-esverdeados. Atávica é minha teimosia, e minha mania de querer dar a última palavra. Minha avó sempre dizia "por cima de mim só avião a jato, e mesmo assim sem piloto”, para explicar as coisas todas que ela sabia da vida. Estou longe da experiência  que minha avó teve – mas, para minha sorte, acho que herdei um pouco dessa característica também. E eu li os seus sinais: tudo o que você disse, sem querer dizer. Tudo o que foi dito depois do silêncio. Essa sua vontade de querer tudo certo também é atávica? Sinto muito: a vida não é precisa, simétrica, ordenada, um corte cirúrgico. A vida acontece, simplesmente.

domingo, 19 de junho de 2011

Petrúquio

O Petrúquio morreu hoje. Faz 2 anos e 7 meses que eu o ganhei de aniversário da Érika. Não sei ao certo qual idade ele tinha, mas imagino que tenha vivido pelo menos 3 anos.

Petrúquio Petrônio foi um peixe beta de personalidade. Ele era o "cachorro" desta casa. Sempre nadava agitado quando chegávamos em casa. Se visse alguém por perto, ficava "pulando" no aquário, para chamar a atenção. Adorava a hora de comer. Para dormir, gostava de ficar embaixo do cogumelo.

Acho que ele teria vivido mais, mas depois que teve uma infecção no olho ele nunca mais foi o mesmo. Nós tratamos, ele se recuperou, mas, com o perdão pelo lugar comum, perdeu o brilho no olhar.

Passou os últimos noventa dias oscilando. Alguns dias era o mesmo Petrúquio de sempre, em outros era um peixe envelhecendo, mais contido, mais cansado. Não sei quantos dias ficou sem comer, absolutamente nada, porque não aguentava subir para buscar a comida. Nestes últimos dias, perdeu também a linda cor vermelha que tinha. Pouco a pouco, as escamas acinzentaram – não, não foi outra doença. Só era mesmo a vida indo embora.

Ontem, acho que para se despedir, pulou várias e várias vezes, como fazia antes. Fiquei por perto bastante tempo, primeiro fazendo festa, depois em silêncio. Porque a vida pede silêncio para se despedir.

sábado, 18 de junho de 2011

Gota

Mínimas versões possíveis


O corpo transbordou. Alegria, tristeza, expectativa, renúncia, desejo, saliva, segredo, hálito. Tudo de uma vez.


Água, e o corpo transbordou. Alegria, tristeza, expectativa, renúncia, desejo, saliva, segredo, hálito. Torrente, enchente, tudo de uma vez.


Aquela foi a gota d'água, e o corpo transbordou. Alegria, tristeza, expectativa, renúncia, desejo, saliva, segredo, hálito. Gota d'água, água da chuva, refletiu no corpo rio, correu pro mar. Torrente, enchente, tudo de uma vez.


Suportas a vida em conta-gotas?

Acorde

Acorda
Acorde
A
corda
A cor
do acorde
A cor
da
corda
A cor
de
um
acorde
a
corde
a
corda
a
zul

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Sinos

Os sinos badalaram ao meio do dia, no meio da metrópole movimentada, apressada para o almoço, carregando nas mãos casacos e celulares. Mãos e pés e mandíbulas apressadas, ouvidos ocupados igualmente apressados, certamente ignoraram. Mas os sinos continuaram a badalar.

Sob a sombra de uma árvore próxima, a senhora com roupas puídas e um velho terço nas mãos ouviu os sinos atenta. E rezava, mesmo antes de entrar na igreja. Sem pressa. Os lábios murchos, as mãos enrugadas, o olhar na igreja. Os passos lentos. Sem pressa, ela pedia pelas almas dos vivos, e também dos mortos.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Plenilúnio

Hoje quis ver o eclipse lunar... mas a hora em que finalmente pude fitar a lua, na noite fria, o fenômeno já havia encerrado. Ainda assim, a lua alta, cheia, imponente no céu, me encantou...

Lamento, senhores... mas hoje faltam imagens, e certamente irão faltar palavras para tentar descrever a beleza lunar neste frio céu de junho.

Que as palavras transbordem e façam surgir na memória as mais belas imagens de plenilúnios, portanto.

Sorrisos à luz da lua...

terça-feira, 14 de junho de 2011

Perspectiva



Porque o ângulo é obtuso apenas sob um ponto de vista. Porque, se de um lado é côncavo, do outro é convexo. Porque na vida nem tudo é geometria, mas há que se ter aspectos complementares, partículas que se atraem, que se afinam – se algo é como é – ou seria melhor dizer está como está? – existe uma razão, mesma que esta não seja ainda clara, palpável, conhecida.

É possível mudar sua perspectiva? Talvez assim tudo faça sentido. E, se ainda assim, não ficar claro de imediato, paciência. A simples passagem do tempo, 90, 180, 360o – eu, você e todas as coisas... nós somos atravessados pelo tempo – isso por si só gerará novas ou revisitadas perspectivas.


E o tempo não espera, porque o círculo não é redondo” Antes da Chuva [filme, 1994], que assisti há mais de 15 anos e preciso rever.

O futuro está firme, caro sr. Kappur, nós é que nos movimentamos no espaço infinito”

Tateantes, minhas mãos vão à procura do amor, buscam palavras da oração que meu lábio deseja e não conhece” Franz Xaver Kappus.

As duas últimas li também há mais de 15 anos em Cartas a um jovem poeta, 17a. ed., de Rainer Maria Rilke.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Torpor

Por causa de um exame médico, precisei hoje fazer uso de um medicamento que “me apagou”. Estranho quando a gente volta a si, porque você fica se perguntando uma série de coisas. Como um estado de sonho, um semi-acordado, um leve torpor...

E ai, há que se ter confiança. Porque você precisa acreditar que as coisas aconteceram como lhe foram contadas. Você não lembra o quê, não lembra como... “tinha um lapso no meio do caminho, no meio do caminho tinha um lapso”... mas não era pedra?

O quanto a confiança precisa ser cega? O quanto precisamos de um “leve torpor” na vida, no relacionamento, para que ele seja possível? Não nos é possível controlar tudo, o tempo todo. Aliás, tenho acreditado firmemente que não nos é possível controlar quase nada em nossas vidas, e em nós mesmos, durante todo o tempo.

Há que se ter um “leve torpor” na vida, para que seja possível, para acreditar, para se entregar. Para fluir.

domingo, 12 de junho de 2011

Risco

Inevitável não falar sobre relacionamentos hoje... se esse blog durar até junho de 2012, quero ver sobre o que vou falar no próximo dia dos namorados...

Recebi um e-mail ótimo de uma amiga, solteira: “Por que eu tenho que passar o dia dos namorados com um? Eu não passo o dia dos índios com um índio, nem o dia da árvore abraçada com uma”.

Humor à parte, o fato é que muitos de meus amigos solteiros estão em busca de alguém... qual será o segredo, se é que existe um, para fazer “dar certo”?

Eu também não sei. Mas uma coisa eu sei: a gente precisa querer. E precisa aceitar que quer. E precisa assumir que quer. E precisa assumir o risco, também. Precisa assumir nossa incompletude, e nossa fragilidade. Pode não dar certo sempre. Mas vai dar certo, sabe-se lá por quanto tempo.

sábado, 11 de junho de 2011

Tecnologia

Viva a tecnologia! Há alguns poucos anos, quando iniciou a portabilidade entre operadoras de celular, trocar de operadora não foi exatamente simples. Documentos, formulários, mais formulários, algumas horas na loja, troca de aparelhos com vantagens? Só se comprar na hora.

E hoje? A única insanidade foi ir ao shopping em um sábado véspera do Dia dos Namorados. Fora isso, tudo fácil e rápido. Faltou o comprovante de residência? Pode enviar por e-mail. Formulários? Duas folhas de contrato, apenas. Algumas horas na loja? Que nada, em menos de 30 minutos estava tudo resolvido. Hum... ainda não decidi qual aparelho. Não tem problema, depois, se quiser, volte aqui, e você não vai pagar preço diferente por isso. Perfeito!

Tive vontade de pedir: ok, Paulo, ótimo. Agora eu quero por favor um coração, novinho em folha, não, não, vermelho não, agora quero um roxo, com sistema Android 2.2, com cartão de 2GB de memória, para eu não me esquecer do que não posso, que permita atualizar aplicativos e sentimentos – apenas os que me interessarem, ok?


Pena... esse produto ele não tinha na loja.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Para compartilhar

Encontrei a beleza... aqui!

Falta

Porque hoje me falta a palavra exata.
Ou talvez porque a falta seja tudo o que se pode dizer sobre o agora.
Falta, buraco, vazio...
a beleza se escondeu em algum lugar.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Estuário


Uma palavra exata, duas versões possíveis

I

Ando querendo (re) descobrir
minha geografia
minhas compleições
hídricas
sou rio
mar
ou estuário?

Sou água,
sobretudo.

Nascida no ventre de minha mãe
Acalentada por ela e pelos braços de minha avó
Alimentada com a força de mulheres
Minhas águas desembocam com força
vida afora


II

Ando querendo saber
a geografia do teu abraço

Você é rio
mar
ou estuário?

Onde nascem tuas águas?
Qual é tua foz?
Que sorte terá quem deseja
navegar tuas águas?

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Etecetera


Et cetera: expressão latina que significa "e as demais coisas."


O emprego, o dinheiro, a conta, o outro, o compromisso, o vizinho, o condomínio. O transporte, o conserto, o supermercado, a outra conta, o salto do sapato, a mancha na roupa, o suplemento vitamínico, o e-mail não respondido. A parede descascada, o vaso desflorido, o pó acumulado, o colarinho encardido, a roupa de cama amassada.

Tudo isso é importante. Todas "as demais coisas" têm sua importância – relativa. Não diminuí-la, e tampouco aumentá-la: fundamental.

Você, sua vida e todas as demais coisas. Nada além ou aquém disso.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Ventania

Hoje o vento assoviou forte nas janelas e nos telhados, e trouxe saudades da infância. Dia de chuva era dia de ficar dentro de casa, brincando. Mas brincadeira dentro de casa não era boa como brincadeira no quintal. Dentro de casa, chuva lá fora, o bom mesmo era brincar de ficar quieta, rente à janela, só vendo a chuva chover... minha mãe também gosta de olhar a chuva, acho que é por isso que eu aprendi a gostar.

A gente quieta, lá na janela, a chuva lavando a casa, o quintal, os varais. Depois de passar roupa, a mãe ia pro fogão, fazia bolinho de chuva, que a gente saboreava com uma boa xícara de café com leite.

O vento, a chuva, a infância, o bolinho de chuva. O mundo e todas as coisas, simplesmente. Tudo no seu devido lugar.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Permuta

Eu te dei poesia.
E você, surpresa.
Eu te dei minha escuta em um dia morno e suave.
Você devolveu sua história
sua argumentação por vezes contraditória
e suas verdades transformadas em silêncios eloqüentes.
Eu te dei carinho
você, medo.
Vou te dar minha raiva.
Você me dá sua vida?
Eu vou pensar se te dou – ao menos parte –
da minha alegria.

Para compartilhar

A Cris Martins publicou um texto lindo no seu blog. Porque ecoou na alma, está aqui também...

Lou Salomé é que sabe das coisas

"só aquele que permanece inteiramente ele próprio pode, com o tempo, permanecer objeto do amor, porque só ele é capaz de simbolizar para o outro a vida, ser sentido como tal. Assim, nada há de mais inepto em amor do que se adaptar um ao outro, de se polir um contra o outro, e todo esse sistema interminável de concessões mútuas... e, quanto mais os seres chegam ao extremo do refinamento, tanto mais é funesto de se enxertar um sobre o outro, em nome do amor, de se transformar um em parasita do outro, quando cada um deles deve se enraizar robustamente em um solo particular, a fim de se tornar todo um mundo para o outro."

domingo, 5 de junho de 2011

Passagem

Porque ontem à noite esfriou, e choveu leve poesia, ela amanheceu tépida e orvalhada. Sorriu borboletas, vestiu rosa, tomou café com leite amargo e quente (que o amargo também faz parte da vida) e suspirou desejos. As folhas caindo ao vento iriam acompanhá-la em seu caminho, até que a primavera chegasse.

sábado, 4 de junho de 2011

Tão

Tão tímido, tão arredio, tão quieto.
Tão subversivo, tão polido, tão correto.
Tão austero, tão educado, tão contido.
Tão racional. Tão racional? Ou pusilânime?

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Juliana

Juliana – não me reconheço assim. Mas sei que, se não me chamasse Fabíola, seria Juliana. Gosto do meu nome, da minha data de aniversário, das cores nos meus olhos. Será que eu gostaria de tudo isso se fosse Juliana?

Quais seriam as minhas escolhas se eu fosse a Juliana, e não a Fabíola? Será que eu teria a mesma profissão? Será que gostaria de escrever? Será que teria os mesmos amigos?

Será que estaria, neste momento, digitando estas palavras, vivendo as mesmas emoções? Quem seria a Juliana? E a Fabíola, que não teria sido, saberia?

... definível é somente aquilo que não tem história” (Nietzsche). Se de fato é assim... definições? Eu não as quero – definitivamente. Vou deixá-las para a Juliana, que não foi.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Ferida

Às vezes a gente erra, e pensa as feridas, achando que assim elas irão sarar mais depressa. Ledo engano. Deixá-las expostas à ação do ar e do tempo, cuidando apenas de leve, com água e sabão, pode surtir melhor efeito.

Doce

Esta foi a palavra exata de ontem, quarta, dia 01.

Derramou naquela panela lágrimas de alcaçuz, porções de doçura e uma pitada de melancolia. Cozinhou tudo em fogo lento, mexendo sempre a mistura com a colher de pau, até ter desprendendido do fundo da panela. Cozido, colocou o doce em copos pequenos, e derramou por cima seus granulados desejos.

Serviu depois, murmurando canções e encantamentos, para que a vida ficasse assim, provada em pequenas porções, doce e suave, outra vez.

Porque lembrei de Chocolate, com Johnny Depp e Juliette Binoche.

Aviso aos navegantes

Ai... ontem não consegui postar! Falha técnica... por razão que desconheço, acessei a internet, mas a conexão não encontrava nenhum endereço que eu digitasse... algo relacionado ao DNS.

Conexão sem dificuldades de acesso, dois dias cheios depois, posto agora o que seria o texto de ontem, e o de hoje. Espero que vocês apreciem...