segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Candura

Para minha pequenina, a última palavra exata.

No dia
cor de rosa e azul
a vida amanheceu
cálida
e a noite estrelada a abraçou
suave surpresa

A vida,
agora.
Embalar o ninho.

Vida
acalentando vida.

Lágrimas
e sorrisos.

Para finalizar

"Enquanto a maré banhava a areia da praia, o Homem das Tulipas Holandês contemplava o oceano:
– Juntadora treplicadora envenenadora ocultadora reveladora.
Repare nela, subindo e descendo, levando tudo consigo.
– O que é? – Anna perguntou.
– A água – respondeu o holandês. – Bem, e as horas."

Peter Van Houten, Uma aflição imperial in A culpa é das estrelas, John Green.


Tanto escrevi e tanto senti nas palavras derramadas neste blog... palavras para definir, palavras para lembrar, palavras para criar... para recriar os sentidos... palavras que se tentaram exatas em meio à (in)exatidão da vida.

Minutos e horas, dias, semanas e meses depois do último post... água passando por nós, água pela vida afora... não questiono mais o que há de exato na vida. Vida encantadora, fluindo como água sobre nós, mais que exatidão, hoje acalento a sabedoria e a serenidade para admirá-la, nela mergulhar, deixar fluir, seguir... viver.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Fecundo

Ama-se a idéia antes do fato.
Ama-se o filho muito antes de ele nascer.
Ama-se a concepção. Ama-se a geração.


Ama-se a semente, antes do fruto.
Ama-se a semente, ama-se a essência, ama-se o cerne.


Por que não amar o homem que existe, ainda que adormecido?
Por que não amar o gérmen? Por que não amar a fagulha?


Qual o valor da vida, se não pudermos dizer:


"Vem, planta aqui as tuas raízes.
Sou terreno fértil.
Vem, e cresce, sem medo, em mim".

domingo, 8 de abril de 2012

Para compartilhar


sulco
por Noemi Jaffe


"foi com um espanto grave que li, nesta semana, que o hábito forma sulcos no cérebro e que, quando os estímulos nervosos atravessam os caminhos sulcados, caem inevitavelmente nessas depressões encefálicas, obrigando-nos a repetir nossos gestos e reações. decreto que a função dos poetas é, desde sempre e para sempre, pular, desviar-se, preencher e criar outros sulcos no cérebro, mais rasos, mais numerosos, mais enganosos".


Estamos mesmo decidindo os caminhos de nossa vida? Ou caimos, dia após dia, nos sulcos do hábito?

Fio


Páscoa.


Época, sobretudo, para renascer.


Reuniu forças, em um desejo sincero, e cercou-se de músicas, e de mensagens, e de palavras, de fitas de cetim, de cheiros e aromas. Buscava atiçar a memória de todas as formas. Olhou dedicatórias em livros, encontrou azeites e vinhos e funghi porcini na cozinha.


Dias atrás, a vela que lhe fora dada por um velho senhor gentil, na procissão, apagara vezes seguida, e ela a reacendera, até que aprendeu a manejá-la, a protegê-la contra as rajadas do vento, e a chama seguiu seu curso, por vezes mais impestuoso, mais intenso, e outras vezes mais tranquilo, até a vela toda se consumir.


E agora, ferida tantas vezes no mesmo lugar – Deus do céu, tantas e tantas vezes no mesmo lugar! – sabia que conseguiria renascer. Renascia, sempre. Só não sabia mais do sentimento em si. Esse, por mais que quisesse, não sabia mais se iria conseguir fazer reviver.


La esperanza dice "quieta, hoy quizás sí..." 
Rosas, La Oreja de Van Gogh

domingo, 1 de abril de 2012

Solitude

Quando você tem a exata noção de que está só – de que somos sós...


Não importam os amigos. Não importa a família. Não importa o seu trabalho. Não sei se – e quanto, se este for o caso – importam as suas escolhas.


Sei que não quero me embriagar. Não quero me entorpecer. E não falo desta ou daquela substância que me alteraria a consciência. Falo das ações que nos afastam da dor que esta consciência possa provocar – a de saber-se só.


Não posso – e não vou – embarcar na auto-comiseração. Não posso –  e não vou – obliterar a minha visão de mundo com as verdades absolutas propostas pela prática religiosa fanática. Não posso – e não vou – mergulhar no trabalho a tal ponto de não ter tempo para viver as demais áreas – as fundamentais áreas – da minha vida. Não posso – e não vou – fazer de uma relação um ancoradouro da minha existência.


Obstante tudo isso... olho para todas as coisas... olho para todas as pessoas... olho para mim mesma... e vejo a efemeridade em tudo.


Tendo consciência de mim mesma, de tudo e todos que cercam...


Tendo consciência da minha solitude, da minha finitude, de meus desejos e escolhas... uma só coisa, afinal, me parece acertada: colocar meu coração, minha chama, minha anima... no viver.


Só isto. E isto já é o bastante.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Aniversário

E foi assim, no escuro, sem soprar velinhas... sem lembranças nem mesmo por parte de sua criadora... que este blog completou seu primeiro aniversário, em 24 de março.

Algumas centenas de postagens... alguns milhares de acessos... e a busca pela exatidão na vida - será que existe?

Continuo sem respostas... mas ainda mais apaixonada pelo viver.

"Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa".
Guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas.

sábado, 24 de março de 2012

Para compartilhar


Tom, amigo querido, muitíssimo obrigada!

"A água passa por uma frase e por mim.
Macerações de sílabas, inflexões, elipses, refegos.
A boca desarruma os vocábulos na hora de falar
E os deixa em lanhos na beira da voz".

O Guardador de Águas - Manoel de Barros

Brevíssimo

Escrever cabe em um breve instante. No espaço entre o abraço compartilhado... no interlúdio entre um beijo e outro... no escolher qual música vai tocar agora. Escrever cabe no silêncio entre uma fala e um suspiro. Escrever para eternizar o instante - seja pela dor, seja por amor.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Renovatio

"Found yourself in a new direction"

Foi preciso cozer o vestido roto.
Careceu trocar a água da moringa, que a primeira já não estava mais fresca.
Foi preciso plantar um novo jardim, e trocar as flores do vaso.
Necessitou mudar a mobília da sala, e mudar a cama, no quarto.
Deixou os lençóis quarando, e depois enxaguou com água com anis.
Leu os mesmos livros queridos, de novo - que a leitura, tal como a água do rio, se refaz - mas leu livros novos também. Outras melodias alcançaram seus ouvidos.
De repente, um vestido novo. Um perfume novo.
Cítrico. Vermelho. Amarelo. Verde. Azul marinho.
A pele nova. (Re) novada.

E a vida, se fazendo, refaz.

Verso no início retirado de Myth, Beach House.